sábado, 8 de outubro de 2011

O preconceito na profissão

            Preconceito. Essa é a palavra que resume toda a trajetória de um “manicuro” até o reconhecimento profissional. A sociedade ainda não está preparada para que ambos os sexos atuem em atividades que antes eram majoritariamente feitas por um dos dois.

            A primeira vista pode ser até fácil. Mas após análise criteriosa pode-se perceber o quão difícil é fazer as unhas de pessoas que você não tem intimidade. “Foi bem difícil quando eu comecei. Ninguém botava fé em mim. Ficava pensando se um dia os clientes entrariam aqui no salão e não me julgariam pelo sexo”, afirma Eduardo Freire, design de unhas (vulgo manicuro), estudante de  biblioteconomia da UFPE e trabalha no salão Edelson há três anos.
                  
A situação não foi diferente para Rafael Batista, que hoje é bolsista do curso de direito da Universidade Católica de Pernambuco (Unicap).“Já fui chamado de biba e de pedófila (sic), mas nunca me abalei. Minha namorada acha que é melhor assim. Ela não gosta de concorrência”, relata Batista com muito bem humorado mas não menos traumatizado por essas adversidades da vida.
            A namorada de Rafael, Joana, avalia com muita naturalidade  esse preconceito. Estudante de Ciências Sociais da UPE, analisa de maneira sociológica toda a conjuntura (preconceito) da população pernambucana. “Queria o quê? Estamos galgadas  numa cultura machista onde o homem é quem manda. As pessoas não conseguem ver um homem fazendo coisas de mulher”, disse.
Rafael e Joana
            “Principalmente no subúrbio essa profissão é muito comum. Quando existe uma vítima de preconceito no ato do trabalho, está relacionada à execução de sua atividade profissional em casa, por isso enquadramos na lei Maria da Penha, que aborda a violência doméstica contra qualquer pessoa independente do sexo”, explica a delegada da delegacia especial da mulher,Denise Valentim.
            Pelo jeito ainda temos muito que melhorar enquanto pessoas convivendo e trabalhando num meio patriarcal, mas uma é coisa é certa: personagens como Eduardo e Rafael mostram como é fácil superar o preconceito e ainda driblar os devaneios da vida pernambucana machista, afinal são referências no estado.       
Manicuro (Eduardo) e cabeleireiro(Joel) do salão Edelson


Gerente do salão Edelson

              DIVERSIDADE -  O estudante de Jornalismo Luís Charamba não esconde sua vaidade e até posa para uma foto mostrando o cuidado que tem com suas unhas. “Acho uma besteira essa coisa de profissão para homem e para mulher. Eu não tenho preconceito e já fiz minhas unhas com um homem”, analisa.
Luís Charamba - Estudante de Jornalismo
               Os irmãos de Charamba também fazem as unhas. “Eles são tão tranqüilos e não ligam para a distinção de sexo, pelo menos na hora de trabalhar”, brinca. Pessoas como esses adolescentes são exemplos para uma sociedade igualitária no que diz respeito às oportunidades de trabalho. Afinal a própria  tarja branca da bandeira nacional prevê isso: “ordem e progresso”.


Leandro (manicuro)



“Manicuro”


 

Por Angélica Zenith




Século XXI. A variedade das profissões tornou-se mais presente e evidente. Carpinteiro, assessor de elevador, pedreiro, blogueiros, cabeleireiros, twiteiros, entre outras inúmeras profissões criadas, recriadas e até funções antes só exercidas por homens, ou por mulheres, hoje contemplam a unisexualidade das movimentações mercadológicas.



Como é o caso de Paulo de Aquino, 22, que há três anos resolveu se especializar fazendo unha. “Sempre gostei de fazer a minha unha. Antes um amigo meu era quem fazia para mim, mas doía muito porque ele fazia muito “bife”, por isso resolvi aprender”, contou Paulo, que decidiu investir na área por falta de oportunidade em outros setores. 



Competente, atencioso e muito divertido. É assim que as clientes do salão de beleza de dona Selma, localizado na Rua Afonso Pena, na Boa Vista, definem o mais novo manicuro do local. Pois assim que começou a praticar em casa fazendo a unha da mãe e das irmãs, Paulo logo foi contratado.



A dona do salão de beleza, Selma Gomes, 58, disse que está muito satisfeita com o trabalho de Paulo e endossa a importância dessa “nova era” de aceitabilidade no mercado de trabalho. “Esse novo período é muito importante. As pessoas agora tendem a deixar o preconceito de lado. Não importa a sexualidade, mas o desempenho profissional de cada um”, contou Selma.








Renata Oliveira, 35, trabalha no salão há 10 anos como cabeleireira e disse que é engraçado ficar observando as reações das clientes quando chegam e encontram um homem com o pincel de esmalte na mão. “Risadas, cara de espanto e até aquelas que não entendem e perguntam para confirmar: É você mesmo que vai fazer a minha unha? Eu me divirto muito e tenho certeza que as clientes estão gostando”, disse a cabeleireira.





Para a maioria dos clientes do salão, vê um homem fazendo unha é inusitado. A estudante Adriana Ribeiro, 25, achou muito estranho quando entrou no salão e encontrou um homem sentado pintando as unhas de uma cliente, mas diz que não tem preconceito. “Só achei esquisito. Quando Paulo perguntou se eu me importava dele fazer minha unha, eu disse que não, mas confesso que fiquei meio desconfiada. Não acreditava que um homem pudesse fazer unha tão bem”, revelou Adriana.

Porém nem todas as clientes encaram dessa forma. A auxiliar de serviços gerais, Angelita Rodrigues, 33, diz que a situação causa desconforto, por isso prefere fazer sua unha com as mulheres. “Acho que fazer unha é atividade para mulher. Não me sinto confortável e nem acho certo, mas tem quem goste e confia”, disse Angelita.

O cenário de hoje entra em contradição com o que muitos conservadores, como Angelita, pensam. Os espaços que antes eram restritos ganham e oferecem oportunidades para que as pessoas coloquem em prática seu lado profissional, não o sexual - o que também era decisivo na contratação de um trabalhador. 



Vídeo - Paulo conta as dificuldades da profissão


Ouça a entrevista com a dona do salão - Selma Gomes